A evolução da freqüência


 

Acredito que todos já tenham utilizado as batidas do coração como um modo de calcular a passagem do tempo. Na verdade, qualquer fenômeno que produza uma vibração estável é, na sua essência, um relógio.

Num relógio mecânico, o "órgão" produtor de tais vibrações denomina-se balanço. O escapamento é o mecanismo responsável por contar tais vibrações, bloqueando e liberando todo o conjunto de engrenagens do relógio, num ritmo ditado pelo balanço. O número de dentes das engrenagens do relógio é calculado de tal forma que, mantida estável a freqüência do balanço, seja possível a marcação precisa da passagem do tempo (à direita, balanço do movimento IWC Cal. 5000).

                                                                                       

Parece simples, mas diversos fatores afetam a freqüência do balanço, tais como choques externos e rotações sobre seu próprio eixo. Cada imperfeita oscilação do balanço traduz-se numa incorreta marcação do tempo, acumulando-se a longo prazo.

Quanto maior a freqüência do balanço, menor o erro causado por uma imperfeita oscilação. Imaginem um relógio cujo balanço tenha sido projetado para oscilar 1000 vezes a cada hora. Devido a fatores externos, porém, 10 oscilações deixam de ocorrer. O ponteiro do relógio, em virtude do projeto do movimento, só demonstra a correta passagem de uma hora no mostrador após 1000 "tique-taques" precisos. Tal relógio, portanto, estará marcando o curso do tempo com um erro de 1%.

Imaginem agora o mesmo relógio, mas com um balanço projetado para oscilar 2000 vezes por hora. A não ocorrência de 10 oscilações, neste caso, causaria um erro de apenas 0,5%.

Até a metade do século XX, todos os movimentos de relógios eram projetados para operar a 18.000 batimentos por hora (2,5Hz ou 5 batimentos por segundo. A cada "tique-taque" do relógio, ocorre uma oscilação do balanço). Era impossível aumentar a freqüência de tais movimentos sem sacrificar a durabilidade dos relógios, sobretudo pela inexistência, naquela época, de lubrificantes adequados (à esquerda, movimento Minerva Cal. 49 - 18.000 bph; acionamento indireto do ponteiro de segundos).

Os fabricantes, portanto, buscavam eliminar as demais variáveis que influenciavam a precisão do relógio. Com bons projetos e construção meticulosa, atingiram excelentes resultados.

No final dos anos 40, alguns fabricantes introduziram movimentos com freqüência de 21.600 bph (3Hz), teoricamente mais precisos que os de 18.000 bph. Outros fabricantes, porém, encararam a evolução como uma maneira de construir relógios tão precisos quanto os de baixa freqüência, a um menor custo. Seria possível sacrificar ajustes e bom acabamento em troca de um movimento com maior freqüência.

Mas os aumentos de freqüência alcançaram seu patamar, ditado principalmente pela dificuldade relacionada à lubrificação. Assim, a partir do início dos anos 70, tornou-se comum o uso de movimentos com 28.800 bph (4 Hz).

Todavia, isto não impediu que outras fábricas procurassem o aumento da freqüência através de novas tecnologias. O popular Bulova Accutron, por exemplo, possuía um movimento eletro-mecânico cujas vibrações do órgão regulador alcançavam a marca de 360Hz. Com tamanha freqüência, era possível atingir uma variação não superior a 1 minuto ao mês (à direita, movimento Rolex Cal. 3155, 28.800 bph, utilizado nos modelos Day/Date).

A resposta mecânica a tal inovação foi o movimento de altíssima freqüência, 36.000 bph (5Hz), criado pela Favre-Leuba em 1968. Na época, a dúvida residia na sua durabilidade a longo prazo. Hoje, podemos assegurar a eficiência desta inovação. Movimentos de 36.000 bph, como por exemplo o Zenith El Primero, provaram-se bastante resistentes após décadas de uso.

Os suíços, porém, não anteciparam a revolução que ocorreria alguns anos mais tarde, no fim dos anos 70: a popularização dos relógios a quartzo. Operando a 33.768 Hz, eram muito mais precisos que os melhores movimentos mecânicos.

Atualmente, diversas fábricas ainda produzem movimentos mecânicos de baixa freqüência e altíssima precisão. O novo movimento da tradicionalíssima IWC, o calibre 5000, utiliza um balanço de grande diâmetro, espiral de Breguet e um excelente sistema de corda. Tudo produzido por mãos humanas. A atenção aos detalhes, nos moldes da tradição suíça, compensa a lenta oscilação do seu balanço, de 18.000 bph (à esquerda, movimento IWC Cal. 5000).

 

 

 

 

Créditos

Foto do Minerva Cal. 49 por David Gruber; IWC Cal. 5000 por Michael Friedberg.